Relatório da IFLA é atualizado em relação às tendências em bibliotecas

Será que vamos ver reforçada a importância dos serviços e espaços virtuais, ou haverá uma reação analógica contrária? Iremos assistir a uma maior polarização política e a um enfraquecimento dos conhecimentos especializados, ou será finalmente reconhecida e valorizada a competência em informação (information literacy)? Veremos uma ação significativa a favor da equidade e da diversidade, ou apenas assistiremos ao aumento das desigualdades? O IFLA Trend Report Update de 2021 partilha tendências sugeridas por líderes emergentes de bibliotecas de todo o mundo e ideias sobre como trabalhar com essas tendências.

O Relatório de Tendências original da IFLA é o resultado do diálogo entre o campo da biblioteca e peritos de uma ampla gama de disciplinas. Cruzar experiências e perspectivas proporcionou uma nova oportunidade de explorar e discutir as tendências emergentes que estão moldando o mundo no qual as bibliotecas atuam.

Esta é uma tradução livre e adaptada de Elisabeth Dudziak do Relatório atualizado de tendências em bibliotecas da IFLA (Trend Report Update de 2021), que acaba de ser publicado. De acordo com a própria IFLA, o Relatório não procurou prever o futuro, mas sim explorar as forças que o influenciarão. A partir do relatório original, há um conjunto de dados e informações que pode ser utilizado e partilhado pelas bibliotecas, incluindo uma bibliografia e revisão de literatura sobre as tendências, documentos de peritos e sumários de discussão. As atualizações subsequentes abrem novos caminhos e questões para reflexão, trazendo novas vozes de dentro e de fora da área das bibliotecas.

O Relatório pretende ser um ponto de partida – um catalisador – para a discussão tanto dentro da área das bibliotecas quanto junto a parceiros externos. É um apoio para pensar na melhor maneira de se preparar para o que está por vir, para que as bibliotecas não só sobrevivam, mas prosperem.

A forma como as bibliotecas responderão a estas tendências terá uma influência decisiva sobre quão grande será seu papel nas instituições e na evolução do cenário da informação. Esta é talvez a questão mais urgente com que se defronta o profissional da informação.

Por meio de um questionário enviado a líderes emergentes ao redor do mundo, os respondentes foram convidados a identificar potenciais tendências em relação ao futuro. As tendências aqui expostas são apenas uma forma de dividir o rico e diversificado conjunto de ideias recebidas. Algumas são gerais, falando de mudanças na política e na sociedade, enquanto outras são mais específicas, relacionadas às bibliotecas. 

Confira as vinte tendências mais relevantes, reveladas a partir do questionário:

TENDÊNCIA 1Tempos difíceis pela frente. Uma lenta recuperação da COVID irá pressionar todas as formas de despesas públicas, exigindo que as bibliotecas intensifiquem os esforços de advocacy. Mais do que nunca as bibliotecas devem mostrar seu valor, demonstrando o impacto de seu trabalho à comunidade que servem, a possíveis parceiros e à sociedade em geral. Além disso, é necessário fazer das bibliotecas uma parte integrante de diferentes ministérios, agências e organizações, assegurando que as bibliotecas sejam mais capazes de compreender e responder às necessidades. Para tanto, as bibliotecas podem precisar trabalhar mais para alinhar (ou demonstrar alinhamento com) as prioridades de governos, instituições patrocinadoras e outros.

TENDÊNCIA 2O virtual chegou para ficar. As pessoas continuam a preferir o acesso remoto aos serviços das bibliotecas, colocando em cheque o valor dos espaços físicos e atendimentos presenciais. Os colaboradores salientaram o risco dos governos procurarem meios de poupar gastos, combinado com a (incorreta) crença de que, graças à tecnologia, as bibliotecas são menos necessárias do que antes. Em particular, notaram preocupações que a automatização de algumas tarefas da biblioteca poderia levar a uma sensação de que menos pessoal é necessário. Adicionado a isto, outros sublinharam que a tecnologia vem com os seus próprios custos, não apenas na compra inicial, mas também sua continuidade, manutenção e atualizações. Ao mesmo tempo, num ponto ecoado na décima tendência, o potencial total do virtual só poderá ser alcançado quando ambos (bibliotecas e usuários) tiverem os equipamentos (hardware) e as competências necessárias. Além disso, ao passar para o virtual, as bibliotecas correm o risco de competir com outros serviços online, chamando a atenção de outras pessoas. A fim de poder reter sua “quota de mercado”, as bibliotecas precisariam prestar mais atenção à tecnologia, compreender suas implicações e reagir adequadamente. Além disso, as bibliotecas correm o risco de ter menos recursos financeiros para utilizar em seus espaços físicos. Além disso, o fornecimento de serviços virtuais levanta questões sobre como proteger os direitos fundamentais, nomeadamente a privacidade dos usuários e os direitos de propriedade dos fornecedores.

TENDÊNCIA 3 – A redescoberta dos espaços físicos. As pessoas vão redescobrir o valor dos espaços das bibliotecas que oferecem oportunidades significativas de intercâmbio e discussão. Alguns colaboradores sentem que as pessoas teriam todo o prazer em voltar a frequentar as bibliotecas, promovendo encontros e oportunidades de estudo. O lugar das bibliotecas no interior das comunidades também apareceram em um número significativo de contribuições, sugerindo a necessidade de uma nova reflexão sobre como se envolver com o ambiente local e outros atores, incluindo empresas. Ao fornecer espaços para o envolvimento ativo com a informação, discussão e a tomada de decisões, as bibliotecas poderiam ajudar a apoiar o desenvolvimento de respostas a questões locais. Diversos colaboradores ressaltaram que espaços físicos e tecnologia não se excluem mutuamente.

TENDÊNCIA 4 – A ascensão de competências transversais. Numa época de rápida evolução das tecnologias, torna-se cada vez mais importante para os bibliotecários serem capazes de inovar e adaptar-se a situações imprevistas. A capacidade de compreender e responder às necessidades individuais, com base em inteligência emocional está clara, de modo a apoiar o bem-estar e ajudar a desenvolver as meta-competências necessárias para que os usuários se tornem participantes ativos na sociedade da informação. Em todos os sectores econômicos, o valor das habilidades ‘suaves’ (soft skills) tem aumentado, bem como a capacidade de aprender e reciclar o que se conhece. Para os profissionais que atuam nas bibliotecas não é diferente. Conforme evoluem os materiais disponíveis nas bibliotecas e as formas de acesso, bem como evoluem as necessidades e expectativas da comunidade, é importante ter as competências que nos permitem evoluir com eles. Tipos específicos de competências ‘suaves’ destacadas pelos colaboradores incluem a resiliência, agilidade, flexibilidade, construção da confiança da comunidade, construção de parcerias, resolução de problemas e uma capacidade de responder positivamente ao inesperado. O desenvolvimento profissional é importante.

TENDÊNCIA 5 – A diversidade levada a sério. Há uma consciência crescente a respeito da existência e do impacto da discriminação, levando a uma reforma radical das coleções das bibliotecas, serviços e práticas. Os colaboradores sublinharam que os recentes acontecimentos lançaram uma nova luz sobre a necessidade de promover a equidade, diversidade e inclusão como prioridade, se quisermos torná-los uma realidade. Esta é uma questão em termos não apenas de como as bibliotecas podem contribuir para uma uma sociedade melhor, mas sobre como trabalhamos. Isso significa que o sucesso das bibliotecas é medido em termos da sua capacidade de ajudar a todos os membros das comunidades que servem para satisfazer as suas necessidades de informação e realizar o seu potencial. Para ter sucesso, teremos de continuar a desenvolver ferramentas e competências que nos permitam identificar eficazmente as diferentes necessidades, bem como os impactos das bibliotecas, suas práticas e oferta atual de serviços. É necessário também compreender como podemos avaliar a diversidade das coleções e encontrar as lacunas. Os peritos em catalogação têm um papel importante a desempenhar em termos do design thinking e da acessibilidade. A tecnologia oferece realmente interessantes possibilidades aqui. Novas possibilidades para pessoas com deficiência foram alcançadas, mas há ainda potencial a ser realizado em termos de modulação da prestação de serviços para maximizar o seu impacto positivo.

TENDÊNCIA 6 – Um balanço ambiental. As alterações climáticas trazem novas ameaças às bibliotecas e às comunidades que atendem, forçando uma adaptação radical a fim de evitar o desastre. Em relação aos edifícios, novas orientações arquitetônicas são necessárias para aumentar a eficiência energética e prevenir riscos, a fim de evitar perdas insubstituíveis. Encontrar formas para conscientizar as pessoas sobre isso também pode ser importante. Os colaboradores também viram um papel importante das bibliotecas no sentido de promover a mudança de comportamento e maior empoderamento climático, em consonância com um mandato mais amplo para se envolver em questões sociais. Assim como a sensibilização e o exemplo que pode ser definido através de edifícios ‘verdes’ de bibliotecas, há um papel potencial particular na divulgação dos conhecimentos necessários para a mitigação ou adaptação, por exemplo, em zonas rurais e comunidades agrícolas. Nessas áreas, a adoção de novas práticas pode ajudar a reduzir as emissões e ajudam as pessoas a lidar com as as mudanças ambientais.

TENDÊNCIA 7 – Uma população móvel. Com pessoas cada vez mais nômades, o conceito de uma biblioteca ‘local’ torna-se menos relevante e aumenta a necessidade de prestar serviços conjuntos que atravessam fronteiras. Também aumenta a possibilidade de as bibliotecas crescerem em importância como espaços de co-trabalho (co-working) na comunidade para pessoas sem um local de trabalho definido.

TENDÊNCIA 8 – O usuário impaciente. Os usuários da biblioteca, em particular os das gerações mais jovens, esperam o máximo em termos de tecnologias e serviços modernos, e correm o risco de se afastarem das bibliotecas se não puderem encontrar nelas tais facilidades. Um passo proposto é trabalhar no sentido de desenvolvimento mais simples e unificado de plataformas que evitam que os usuários precisem iniciar a sessão várias vezes. Isto já é um modelo perseguido pelas grandes plataformas disponíveis na internet (assim como ocorre em ‘bibliotecas das sombras’ como Sci-Hub), e que pode ser visto como uma razão para o sucesso. Uma tal plataforma poderia até ajudar as pessoas a identificar a biblioteca mais próxima, caso os usuários necessitem utilizar recursos físicos. A personalização de serviços também é esperada. Também com base na tecnologia, os colaboradores notaram o potencial dos robôs na prestação de serviços de atendimento 24 horas a distância. Da mesma forma, as redes sociais e redes de colaboração (networking) podem também fornecer meios eficazes de chegar aos usuários onde quer que estejam.

TENDÊNCIA 9 – Uma reação analógica. Uma nova geração, traumatizada pelo stress da constante conectividade das redes sociais, vai redescobrir recursos físicos – incluindo livros impressos – como uma fuga. Muitas contribuições recebidas destacaram que, especialmente com a experiência da pandemia, as pessoas estão cada vez mais conscientes das limitações das ferramentas digitais. Não devemos ver a tecnologia como um fim em si, mas sim como uma ferramenta entre outras. De fato, há a sensação de que por vezes a tecnologia é super valorizada e que é tempo do pêndulo balançar de volta para formas mais analógicas de fazer as coisas. Isto poderia incluir uma reavaliação (e nova apreciação) dos papeis e atividades tradicionais. Para muitos, a leitura de um livro físico permanece, como uma experiência diferente – e mais rica. Experiências físicas podem servir como antídoto ao stress provocado pelas interações digitais. Quando a sociedade for reaberta às oportunidades de convivência presencial, as bibliotecas podem ser fundamentais tanto como espaço e como centros de condução ao bem-estar e espírito comunitário. Paralelamente, os colaboradores sublinharam a importância contínua de coleções físicas, e o valor que possuem por seu conteúdo e experiência que proporcionam.

TENDÊNCIA 10 – A escala importa. O custo da prestação de serviços completos e modernos significa que só é possível manter bibliotecas em instituições maiores, colocando instituições menores em risco, por serem incapazes de responder às demandas. Em particular, dado o ritmo rápido das mudanças tecnológicas, equipamentos e serviços tornam-se rapidamente desatualizados e precisam ser substituídos. Além disso, há custos contínuos associados às taxas de licenciamento e atualizações. Finalmente, a fim de utilizar ferramentas disponíveis de modo efetivo, há também a necessidade de formação contínua e apoio ao pessoal da biblioteca. Tudo isso implica em uma necessidade considerável de investimento. Os colaboradores destacaram a preocupação de que corremos o risco de ver duas classes de biblioteca – aquelas que são capazes de acompanhar as mudanças (em geral são as bibliotecas maiores, com melhores recursos e que contam com equipes e o apoio necessários para trabalhar com novas ferramentas), e as que são deixadas para trás.

TENDÊNCIA 11 – O domínio dos dados. Novos usos e aplicações de dados mudam dramaticamente a vida econômica e social, tornando cada vez mais importante que as pessoas se tornem ‘alfabetizadas em dados’, a fim de interpretá-los e utilizá-los adequadamente. O papel crescente da inteligência artificial (IA) e outras aplicações de dados na vida diária foi outra tendência apontada por muitas das contribuições recebidas. Os dados estão no centro de uma maior individualização dos serviços, a fim de relacionar melhor as necessidades e interesses de alguém. Isso já ocorre em diversos sistemas: ferramentas semelhantes já servem para dirigir a publicidade e modificam o modo como os usuários são ligados a serviços e produtos online. Por outro lado, leis recentes de proteção a dados conduzem à necessidade de maior conscientização dos usuários sobre o tema, em termos das opções existentes  e suas consequências. Para as bibliotecas, existe um papel potencial a desempenhar na construção da consciência sobre como utilizar os dados eticamente a fim de apoiar eficazmente a pesquisa e os novos conhecimentos científicos.

TENDÊNCIA 12 – A busca transformada. A inteligência artificial revoluciona a forma como encontramos a informação, tornando possível fornecer resultados cada vez mais precisos para os usuários. Corroborando a tendência 11, o uso da inteligência artificial também se aplica à busca e descoberta de informações, uma área que as bibliotecas conhecem muito bem. Alguns colaboradores consideram essa tendência uma oportunidade para as bibliotecas, pois os usuários poderiam se beneficiar a partir, por exemplo, de ferramentas como a web semântica. A busca e descoberta de informações eficiente é crucial para os usuários, em meio a tantas fontes de informação disponíveis na Internet. Ainda assim, a confiança na inteligência artificial deve ser ponderada, pois há riscos e custos associados. Ecoando o que foi dito na Tendência 10, há o risco permanente de que o potencial para utilizar eficazmente a IA pode também depender do nível de recursos de cada biblioteca e o investimento feito nas competências de seu pessoal. Tais aptidões são particularmente importantes se as novas ferramentas de pesquisa forem utilizadas com plena consciência dos suas limitações.

TENDÊNCIA 13 – Corrida aos extremos. O debate político fica mais polarizado, tornando mais difícil encontrar consenso tanto na política como na sociedade, minando os argumentos a favor do compartilhamento nas instituições. Os colaboradores notaram a tendência entre alguns de se tornarem mais desdenhosos dos pontos de vista das pessoas que discordam, em vez de procurar engajar-se e compreender outras posições, e chegar a um consenso. Em paralelo, assistimos ao declínio da confiança em profissões que anteriormente gozavam de níveis relativamente elevados de respeito, incluindo jornalistas, pesquisadores e mesmo médicos. Tudo isto tem tido o efeito de colocar em questão a base do conhecimento sobre a qual a discussão política e cívica pode ter lugar, tornando a busca por soluções muito mais difícil. Existe, indiscutivelmente, uma ameaça às instituições. que devem centrar-se na promoção da reflexão, alargando horizontes e sustentando os direitos de todos. Entretanto, nenhum desses pontos aparecem como prioridade para os populistas. Com o tempo, arriscamo-nos a ver as forças populistas vindo à tona, mais com base na força dos suas opiniões e simplicidade dos seus argumentos do que com base em evidências ou respeito aos direitos humanos. As próprias bibliotecas arriscam-se a ser arrastadas para estes debates, envolvidas diretamente em disputas sobre a manutenção de suas coleções ou indiretamente como serviços públicos.

TENDÊNCIA 14 – Aprendizes ao longo da vida. A concepção de ‘um trabalho para toda a vida’ não existe mais, o que significa que mais e mais pessoas precisam se reciclar ao longo da vida. Em resposta, as bibliotecas intensificam as atividades de aprendizagem. Os colaboradores enfatizaram que vivemos um período de rápidas mudanças tecnológicas e econômicas, e parece pouco provável que tais mudanças sejam abrandadas em breve, à luz da necessidade de adotar formas de trabalho e de vida mais sustentáveis. Como já foi salientado na Tendência 6, um impacto deste é provável que resulte em uma grande transformação nos tipos de trabalho que estarão disponíveis para as pessoas. A descarbonização (redução de emissões de carbono na atmosfera, especialmente de dióxido de carbono (CO2) conduzirá ao fim de algumas indústrias e à transformação de outras. Uma maior utilização da tecnologia irá substituir algumas atividades, mas poderá permitir a emergência de novas atividades, ou pelo menos deixar mais espaço e tempo para elas. Uma condição prévia para a aprendizagem ao longo da vida é que todos tenham as competências básicas de alfabetização necessárias para envolver-se com materiais de aprendizagem, bem como competências digitais fundamentais. A alfabetização em sustentabilidade seria indiscutivelmente parte do conjunto de competências necessárias. Uma série de contribuições apontaram essa tendência como uma oportunidade para as bibliotecas reafirmarem seu papel como centros de aprendizagem. Em paralelo, os bibliotecários eles próprios viriam a ser vistos cada vez mais como educadores. Para perceber isto, haveria a necessidade de acesso e uso efetivo de plataformas e recursos, bem como assegurar que as bibliotecas e os profissionais da informação recebessem formação adequada e apoio.

TENDÊNCIA 15 – Uma coleção única e global. Com a digitalização dos recursos e as possibilidades de trabalhar em todas as instituições, não será mais relevante falar em coleções locais, mas sim sobre o acesso a recursos universais. Uma série de contribuições destacaram a tendência para um crescimento da globalização das coleções. Enquanto o empréstimo entre bibliotecas e outras formas de partilha de recursos sempre significou que nenhuma coleção era necessariamente hermeticamente selada, existem agora novas possibilidades para permitir aos pesquisadores e outros trabalhar com uma seleção de materiais, realizada em diferentes bibliotecas. Os colaboradores pintaram um quadro de um sistema digitalizado, com bibliotecas e suas coleções totalmente ligadas umas às outras através das fronteiras. Alguns sugeriram que a globalização pode até ser um gatilho para um novo dinamismo, uma reorientação das bibliotecas para a utilização de dados e informações em escala a fim de desenvolver novas ideias. Conseguir isto exigirá esforço, como aquele envolvido na abertura de dados científicos atesta. Obviamente, isso irá requerer colaboração para permitir a integração de sistemas diferentes, ou a aceitação e aplicação de
normas em comum. Tal como salientado na Tendência 8, quaisquer interfaces e plataformas resultantes também terão de ser bem concebidas e simples, a fim de trazer as coleções em conjunto.

TENDÊNCIA 16A privatização do conhecimento. A utilização de ferramentas tecnológicas, bem como as lentas reformas dos direitos de autor e de propriedade intelectual, significam que é possível aos atores privados restringir e controlar a informação, mesmo a um nível granular, obrigando a permissões e pagamentos. Os colaboradores salientaram as preocupações sobre os esforços para erguer novas barreiras em torno da informação. A tecnologia certamente permite isto, assim como os termos de contratos que as bibliotecas e os usuários têm de aceitar para ter acesso aos materiais digitais (em contraste com a maior liberdade que havia quando os materiais impressos eram comprados). Esta situação é facilitada pelas leis de direitos de autor e propriedade intelectual (copyright) em torno do conteúdo digital. Para além dos bloqueios imediatos sobre o que as bibliotecas podem adquirir, colaboradores também destacaram a falta de certeza que uma falha na atualização das leis de copyright pode causar, por exemplo, em torno de utilizações que estão, no entanto, em conformidade com as missões tradicionais das bibliotecas, tais como a mineração de texto e dados. Limitar as possibilidades de análise ou outras utilizações pode acabar por conduzir a uma nova divisão entre aqueles com e sem os recursos necessários para “comprar com certeza”, pagando por licenças suplementares. Isto tem criado ameaças significativas sobre a capacidade das bibliotecas de assegurar que cada usuário tenha a oportunidade de beneficiar-se do acesso a materiais publicados. Isto, por sua vez, tem impacto na sustentabilidade, em termos das bibliotecas no sentido de reduzir as desigualdades econômicas e apoiar a pesquisa inclusiva, bem como os esforços para resolver os desafios ambientais que enfrentamos. As bibliotecas defendem há muito tempo o movimento em prol de uma maior abertura como antídoto à privatização do conhecimento. Há também uma consciência crescente sobre o papel das bibliotecas como editoras (publishers), articulando sua atuação em torno do ‘knowledge commons‘. Esta situação oferece oportunidades para explorar novos modelos, centrados em acesso, em vez da maximização do lucro de fornecedores e acionistas.

TENDÊNCIA 17 – Qualificações importam. À medida que a complexidade do ambiente de informação aumenta, cresce a necessidade dos trabalhadores de bibliotecas alcançarem níveis mais elevados de educação. Como já destacado na Tendência 4, o conjunto de competências requeridas em relação aos bibliotecários para cumprir seu potencial e o potencial das instituições onde atuam está evoluindo. Isso corrobora a necessidade de maior qualificação e profissionalização do setor, sobretudo quando se trata de assegurar que todas as bibliotecas sejam dotadas de pelo menos um bibliotecário qualificado. De fato, como uma pessoa sublinhou, as competências e a formação frequentemente fazem a diferença entre uma biblioteca que é um armazém de livros de uma biblioteca dinâmica, centrada na pesquisa, na educação cívica. Nesse sentido, além das competências ‘suaves’, há a necessidade de ter competências digitais mais elevadas, que permitam a plena utilização das ferramentas digitais para fornecer serviços centrados no usuário, ser competente em STEAM (science, technology, engineering, arts and mathematics), entender de codificação e programação, ter competência em sustentabilidade ambiental, e a capacidade para avaliar as necessidades da comunidade e dos usuários, além de responder em conformidade. Bibliotecários também precisavam ser treinados para lidar com novos temas, incluindo o acesso aberto a conteúdos e bibliotecas digitais. Assegurar um maior reconhecimento do trabalho dos bibliotecários e salários compatíveis, poderia ajudar a atrair e reter profissionais talentosos, impulsionando ainda mais a capacidade da área em cumprir sua missão. Oportunidades de aprendizagem e certificação de competências, bem como a criação e manutenção de caminhos abertos para a liderança também ajudariam a manter as pessoas na área.

TENDÊNCIA 18 – Valorização da competência em informação Governos e outros reconhecem plenamente a importância da competência em informação como resposta a longo prazo ao aumento da desinformação. A tendência 13 apontou a corrida aos extremos em termos dos discursos políticos e cívicos, e o impacto que isso poderia ter sobre a coesão social e a confiança nas instituições. Isso representa um desafio direto a governos a curto prazo que tentam, com base em dados e evidências científicas, encorajar as pessoas a agir de formas que sejam responsáveis em relação a outros cidadãos e o ambiente. Alguns colaboradores argumentaram que as bibliotecas podem potencialmente ter um papel em discussões políticas mais amplas sobre a competência em informação (information literacy), com base em suas competências e reputação como lugares onde se procura informação de qualidade. Sendo assim, os bibliotecários poderiam até trabalhar com comunicação social para promover a formação e apoiar o combate à desinformação.

TENDÊNCIA 19 – Acesso aberto desafiando as bibliotecas – Com uma quota crescente de informação científica disponível gratuitamente, as bibliotecas são forçadas a adaptar seu papel ou perder relevância e deixar de ser o ponto único de ‘venda’. O movimento de Acesso Aberto (Open Access – OA) tem tido um sucesso significativo no desafio de superar o pressuposto de que os usuários (e as bibliotecas) têm de pagar para ter acesso às publicações e aos resultados de pesquisa. Por outro lado, como alguns colaboradores observaram, a batalha está longe de ser ganha em relação ao acesso aberto. Questões sobre como assegurar a sustentabilidade financeira e escalabilidade dos modelos abertos, maximizando ao mesmo tempo a inclusão persistem. Além disso, muitos pesquisadores e autores ainda duvidam dos méritos do acesso aberto. Bibliotecas devem defender e promover o acesso aberto à informação.

TENDÊNCIA 20 – Desigualdades aprofundadas – Com a tecnologia criando novas possibilidades para aqueles com acesso a ela, a lacuna entre eles e os que não têm acesso à tecnologia, corremos o risco de confinar grandes partes da população à pobreza, a menos que sejam tomadas medidas efetivas e adequadas. O agravamento das desigualdades pode representar um desafio à coesão social, e mesmo o contrato social sobre o qual as sociedades e serviços tais como bibliotecas são construídos. Isso se traduz em redução do acesso à saúde, à educação e a outras formas de participação, representando também um ataque aos direitos humanos fundamentais. Sugestões dos colaboradores em resposta a esse desafio incluiu um maior enfoque em assegurar que os usuários de biblioteca, onde quer que estejam, tenham a possibilidade de acesso e utilização da informação.

De modo sintético, o IFLA Trends destaca cinco tendências:

  • As novas tecnologias vão se expandir e limitar quem tem acesso à informação.
  • A educação online irá democratizar e perturbar a aprendizagem global.
  • Os limites da privacidade e da proteção de dados serão redefinidos.
  • Sociedades hiperconectadas ouvirão e darão poder a novas vozes e grupos.
  • O ambiente global da informação será transformado por novas tecnologias.

== NOTAS ==

a) O documento foi traduzido para o português com auxílio de software de tradução e o texto foi adaptado e resumido, quando necessário. Nesse sentido, sugestões de aprimoramento são bem vindas.

b) Todas essas informações podem ser encontradas no Website http://trends.ifla.org

== Como citar ==

INTERNATIONAL FEDERATION OF LIBRARY ASSOCIATIONS AND INSTITUTIONS. IFLA. IFLA Trend Report 2021 Update. Tradução e adaptação: Elisabeth Dudziak. IFLA, 2022. Disponível em: https://www.aguia.usp.br/noticias/relatorio-da-ifla-bibliotecas/ Acesso em: dia/mês/ano.